domingo, 6 de dezembro de 2015

SEM DELAÇÃO NÃO HÁ PUNIÇÃO

REVISTA VEJA Edição 2455 de 09/12/2015

Especialista na colaboração de criminosos, Stephen S. Trott, o juiz americano que inspirou Sergio Moro, diz por que e quando a delação premiada é crucial para uma investigação

Por: Kalleo Coura



Trott: “Não é preciso respeitar delatores. É preciso apenas ouvir o que eles têm a dizer e investigar a fundo se o que disseram procede”(United States Courts/VEJA)

Na sentença que condenou a cúpula da empreiteira Camargo Corrêa, o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa na Lava-Jato, o juiz Sergio Moro citou longamente o colega americano Stephen S. Trott para ressaltar a importância da delação premiada. "Se fosse adotada uma política de nunca lidar com criminosos como testemunhas de acusação, muitos processos importantes - especialmente na área de crime organizado ou conspiração - jamais poderiam ser levados às cortes", dizia um dos trechos. Em 2007, antes de se tornar conhecido com a Lava-Jato, Moro traduziu um ensaio de Trott intitulado "O uso de um criminoso como testemunha: um problema especial", que discorre sobre os benefícios e as armadilhas das delações. Aos 75 anos, Trott é um especialista no assunto. Como promotor, negociou com criminosos por mais de vinte anos e ministrou centenas de palestras sobre o tema para colegas, policiais federais e agentes de combate ao narcotráfico. Trott falou a VEJA de seu gabinete, em Boise, em Idaho, pelo telefone.

Quando a delação premiada é insubstituível?

Em investigações de grandes organizações criminosas, como as que envolvem crimes de colarinho-branco, corrupção governamental, tráfico de drogas e terrorismo. Em casos como esses, é impossível investigar a fundo sem o uso de criminosos como informantes.

Por quê?

Porque, se não fossem eles, só pegaríamos peixes pequenos - os tubarões ficariam intocados. Entre as funções dos peixes menores, está justamente a de isolar e proteger os grandes. Como os investigadores brasileiros conseguiriam desmantelar essa quadrilha da Lava-Jato sem o depoimento de Alberto Youssef, por exemplo? É preciso que alguém rompa o silêncio.

O senhor acompanha as investigações da Lava-Jato?


Passei a ler sobre ela há pouco, é um caso muito interessante. Tem inclusive algumas semelhanças com o Watergate, que conheço bem. Quando esse escândalo ocorreu, eu era procurador em Los Angeles e trabalhei em um caso menor, mas que tinha conexão com ele. Deparamos com cubanos que tinham ajudado na invasão do edifício (edifício Watergate, onde ficava a sede do Partido Democrata, espionado a mando do então presidente Richard Nixon). Em troca de imunidade, eles nos deram informações valiosas, que ajudaram a chegar até o topo da cadeia de comando e a puxar o fio da meada que levaria ao presidente Nixon e à sua renúncia. No Brasil, parece ter ocorrido algo parecido: uma investigação aparentemente lateral tomou vulto e agora chega muito perto da cúpula do governo.

Dado que as pessoas que fazem acordos de delação premiada são criminosas e, portanto, desonestas, até onde os investigadores podem confiar nelas?

É verdade que informantes envolvidos em atitudes ilícitas são criminosos e que, por causa disso, devemos assumir de antemão que são desonestos e podem, por exemplo, incriminar outras pessoas com o objetivo de escapar da cadeia.

E como escapar dessa armadilha?

Escapa-se dessa armadilha entendendo que o depoimento de um delator tem de ser apenas o ponto de partida do promotor. Daí em diante, ele irá investigar a veracidade das informações e sair em busca de provas robustas, materiais ou testemunhais, que as corroborem. É algo bastante diferente de basear uma investigação apenas na palavra de um criminoso.

A presidente brasileira, Dilma Rousseff, afirmou recentemente que não respeita delatores. O senhor acha que isso sugere um entendimento equivocado da parte dela sobre o papel desses colaboradores?

Eu também não respeito delatores, mas não porque sejam delatores, e sim porque são criminosos. Não é necessário respei­tá-los. É preciso apenas ouvir o que eles têm a dizer e investigar a fundo se o que disseram procede.

Críticos do juiz Sergio Moro já o acusaram de manter suspeitos na cadeia como forma de forçá-los a fazer acordos de delação. O senhor é contra fechar acordos de delação com acusados presos?

O fato de um criminoso candidato à delação estar preso ou solto não faz diferença. A prisão - ou a possibilidade de deixá-la de imediato - é apenas mais um incentivo para que ele fale. Nos Estados Unidos, os bandidos conhecem o instituto da colaboração e sabem que falar é a melhor maneira para se livrar das longas penas. Essa é a preocupação deles.

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

CHOQUE DE JUSTIÇA




ZERO HORA 27 de novembro de 2015 | N° 18368


EDITORIAIS



O Brasil jamais passou por uma situação assim: num dia, o cidadão é poderoso, detém um mandato parlamentar ou a presidência de um banco e, no outro, está na cadeia. Evidentemente, a premissa para isso é a de que o cidadão tenha efetivamente culpa em cartório e que seja investigado com estrito respeito às leis e à Constituição. Trata-se de um choque de Justiça nunca visto na história deste país. Se os processos do mensalão e da Lava-Jato pareceram num primeiro momento obras de procuradores ousados e magistrados destemidos, a chancela do Supremo Tribunal Federal e do próprio parlamento para as investigações e as prisões deixa a esperança de que estamos mesmo migrando para uma cultura de maior seriedade e integridade no trato com a coisa pública.

Essa mudança de mentalidade deve-se, principalmente, à maior vigilância dos cidadãos brasileiros sobre seus representantes. Como se constatou na votação aberta sobre a legalidade da detenção do senador Delcídio Amaral, na última quarta-feira, também para a corrupção a luz do sol continua sendo o melhor desinfetante. Conscientes de que estavam sendo observados, os parlamentares deixaram de lado o espírito de corpo e votaram, em sua maioria, de acordo com as expectativas da sociedade.

Não há milagre nesse processo. Não será de um dia para o outro nem por obra de algum messias da moralidade que o Brasil vai passar do atual estado de degradação de valores para a perfeição em matéria de honestidade e cidadania. Mas os avanços registrados nos últimos anos são significativos, considerando-se desde as leis que responsabilizam gestores públicos até a conscientização de princípios democráticos como a liberdade de expressão e a defesa do consumidor.

Quando as instituições funcionam, a corrupção diminui e a democracia se fortalece.

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

O CRIME NÃO VENCERÁ A JUSTIÇA




ZERO HORA 26 de novembro de 2015 | N° 18367


ESCÂNDALO DA PETROBRÁS


Para ministra do STF, “crime não vencerá a Justiça”A decisão pela prisão do senador Delcídio Amaral (PT-MS) foi unânime entre os cinco ministros que integram a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), na qual tramitam os processos sobre o desvio de recursos na Petrobras, confirmando a opinião prévia de Teori Zavascki.


A ministra Cármen Lúcia disse que o crime não vencerá a Justiça. Ela se referia às tentativas dos investigados de embaraçar as investigações da Operação Lava-Jato e tentar interferir nas decisões do STF. Em um dos votos mais críticos, a ministra relacionou as investigações com o julgamento do mensalão, e afirmou que a Corte não vai tolerar a corrupção:

– Na história recente da nossa pátria, houve um momento em que a maioria de nós, brasileiros, acreditou no mote segundo o qual uma esperança tinha vencido o medo. Depois, nos deparamos com a Ação Penal 470 (mensalão) e descobrimos que o cinismo tinha vencido aquela esperança. Agora parece se constatar que o escárnio venceu o cinismo. O crime não vencerá a Justiça.

O ministro mais antigo na Corte, Celso de Mello, declarou que ninguém está acima de lei. Segundo Mello, as leis também serão aplicadas no caso de qualquer autoridade que tenha cometido crimes:

– Quem transgride tais mandamentos, não importando sua posição estamental, se patrícios ou plebeus, governantes ou governados, expõe-se à severidade das leis penais e, por tais atos, devem ser punidos exemplarmente na forma da lei. Imunidade parlamentar não constitui manto protetor de supostos comportamentos criminosos.

Também votaram os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Após a sessão, Toffoli, que preside a sessão, informou que o tribunal não aceitará intromissões nas investigações em curso.



POLÍTICA + | Rosane de Oliveira

GRAVAÇÕES TORNAM DELCÍDIO INDEFENSÁVEL


Tramar a fuga de um homem condenado pela Justiça e que responde a outros processos, como Nestor Cerveró, é grave para qualquer cidadão. Quando esse cidadão é senador da República, torna-se indefensável. Delcídio Amaral foi preso porque se enrolou até o pescoço na trama para tirar Cerveró do país, numa tentativa desesperada de impedir que o delator entregasse segredos capazes de acabar com sua carreira de senador pelo PT de Mato Grosso do Sul.

As gravações feitas pelo filho de Cerveró, Bernardo, são inequívocas: Delcídio chegou a opinar até sobre o modelo de avião mais adequado para Cerveró fugir para a Espanha, via Paraguai ou Venezuela. Mais do que isso, o senador citou o nome de quatro ministros do Supremo Tribunal Federal com os quais poderia contar para garantir um habeas corpus a Cerveró. Foi a sua ruína.

Tão grave era o caso, que o ministro Teori Zavascki deferiu o pedido de prisão feito pelo Ministério Público Federal, mas consultou seus pares na 2ª turma do STF e o próprio presidente da Corte, ministro Ricardo Lewandowski. Os outros quatro ministros da 2ª turma foram unânimes e referendaram a prisão, mesmo havendo questionamentos jurídicos sobre o flagrante, único caso em que cabe a prisão de um senador ou deputado.

Na reunião em que os colegas referendaram a decisão de Teori, brilhou a lucidez da ministra Cármen Lúcia, com frases que merecem ser reproduzidas como ato de fé na boa política:

Na história recente da nossa pátria, houve um momento em que a maioria de nós, brasileiros, acreditou no mote segundo o qual uma esperança tinha vencido o medo. Depois, deparamos com a Ação Penal 470 e descobrimos que o cinismo tinha vencido aquela esperança. Agora, parece se constatar que o escárnio venceu o cinismo. O crime não vencerá a Justiça. Aviso aos navegantes dessas águas turvas de corrupção e das iniquidades: criminosos não passarão a navalha da desfaçatez e da confusão entre imunidade, impunidade e corrupção. Não passarão sobre os juízes e as juízas do Brasil. Não passarão sobre novas esperanças do povo brasileiro, porque a decepção não pode estancar a vontade de acertar no espaço público. Não passarão sobre a Constituição do Brasil”.


quarta-feira, 22 de julho de 2015

A JUSTIÇA REPÕE A VERDADE E CONDENA OS CRIMINOSOS



JORNAL DO COMÉRCIO 22/07/2015


EDITORIAL




É surpreendente, para muitos idosos, a ação da Justiça condenando pessoas que, antes, jamais seriam atingidas pelas leis, tal a tradição brasileira de que somente pobres, pretos e prostitutas iam para a cadeia. Os religiosos dizem que nada substitui a confissão, pois somente ela pode aliviar as mentes conturbadas dos que cometeram faltas ou simplesmente querem desabafar. A analogia com a corrupção, que está institucionalizada - e agora sendo desmontada - em alguns nichos públicos e privados do Brasil, indica que, como as proibições foram estabelecidas há décadas, algumas não estavam capituladas e, assim, não pesavam na consciência dos modernos transgressores. "Afinal - diziam - aqui todos fazem trapaças."

Provavelmente nenhum confessor perguntará quantas vezes alguém sonegou impostos, se usou de sua posição pública para praticar nepotismo ou se lavou dinheiro na Suíça. Parece que, como ateus em relação à lei, para eles, a preocupação com o destino é apenas não serem presos. Julgam que o destino é o seu Deus e, por isso, tudo esperam dele.

Por isso, nem Deus, Moisés ou Dante poderiam prever que, em algum dia, fossem criados tantos paraísos fiscais, fraudes em contratos públicos ou aplicações financeiras sofisticadas que são pecados mortais. É o caso dos desvios do dinheiro da Petrobras, a qual, ao contrário do que pregam, ninguém deseja ver fechada ou vendida. O que todos clamam é pelo fim das vigarices e que os que as praticaram sejam punidos, como estão sendo, pela Justiça, para felicidade geral dos milhões de empresários e empregados que suam mourejando para honrar seus débitos fiscais com as prefeituras, os estados e o governo federal. Com a confissão ? modernamente a delação premiada ou a leniência para pessoas jurídicas ?, os pecados são perdoados, em parte. Usando desta premissa e contando com o perdão eterno, existem brasileiros que ficam livres durante uma semana, um mês ou um ano até que pratiquem a próxima corrupção.

Contam com um ato de contrição, um exame de consciência bem superficial e, aí, julgam-se absolvidos pelo esquecimento, a morosidade, a burocracia e os meandros dos pesados, antigos e prolixos códigos penais do País, mas cujas modificações começarão a vigorar.

Quando estão no poder, os políticos são cercados por todos os lados. Os cargos disponíveis são disputados acirradamente por qualquer um que tenha um trunfo e pelos amigos. Mas terão mesmo amigos muitos deles? Quando chega a velhice e o afastamento do poder, a maioria percebe que não tem amigos. Se tem, são poucos. É que as amizades mais sinceras desaparecem à medida que os que detêm o poder vão perdendo a sua capacidade de serem generosos.

Daí que não existe nada mais triste do que a volta à Terra por quem habitou o Olimpo. Lembrem-se disso os que ocupam cargos importantes. Os apartados do poder tornam-se reféns de sua própria história. Repetem-na, burilam-na e ficam incomodativos. As poucas visitas vão espaçando suas chegadas. Ficam o tempo suficiente para um cafezinho e ouvir mais um feito, cada vez mais heroico. É que a narrativa vai crescendo com o passar dos anos. O ostracismo a que serão condenados os corruptos contumazes, pelo menos se espera, é a punição divina e dos homens imposta a eles, e não esqueçamos jamais dos corruptores. O castigo para os malfeitos será, depois da punição legal e moral, o esquecimento. É o caso das vigarices na Petrobras.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

DESCULPAS PÍFIAS NÃO BARRAM OPERAÇÃO LAVA JATO



JORNAL DO COMÉRCIO 17/07/2015



EDITORIAL


As frases que mais se têm ouvido durante as fases da Operação Lava Jato devem estar decoradas na mente dos brasileiros. É, quase sempre, um punhado de afirmações óbvias, como "estou à disposição da Justiça". Ora, todos nós, de maneira espontânea ou coercitiva, estamos à disposição da Justiça. A iniciativa pela convocação é da Justiça, não do cidadão, quando se tratar de prestar esclarecimentos.

Outra frase que ficou enfadonha é a de que os bens, os ganhos e as doações para campanhas eleitorais foram declarados, na forma da lei. Ninguém está discutindo isso, dentro da Operação Lava Jato, mas, sim, de onde veio o dinheiro e se é escuso ou não. As tais de assessorias técnicas, inclusive para negócios no exterior, não convencem mais a ninguém, tendo em vista os personagens envolvidos e os seus passados, que, normalmente, não são, digamos, dos mais qualificados.

O fato é que a Petrobras vinha sendo furtada e as notícias foram desqualificadas. Tudo era um complô para vendê-la. Ora, golpe quem vinha praticando eram os que faziam, à luz do dia, desvios e mais desvios de bilhões de reais em prejuízo à estatal. A Petrobras, escoimada dos vigaristas, continuará realizando o seu importante ofício como petrolífera, para orgulho dos brasileiros.

Então, que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário que continuem a fazer o que devem e a Constituição lhes ordena. O povo, em sua maioria, ficará trabalhando e pagando seus tributos. O empresariado se mantenha investindo e acreditando que todas as crises um dia terminarão após tempos de incertezas. Não temos "bandidos de toga" no Judiciário e um ou outro deslize não empana o serviço que a instituição presta ao País. E se é lento, tem muita legislação, entrelinhas e filigranas jurídicas que podem descambar, ao fim dos processos, para algum tipo de injustiça, que se modifiquem, via Congresso Nacional, as leis em vigor.

Que há reclamações sistemáticas e antigas quanto à morosidade e à complexidade da Justiça no Brasil, isso sabemos há muitos anos. Pesquisas revelaram que a população quer um Judiciário que atue mais rapidamente. Não se pode esquecer, é claro, que a pressa é inimiga da perfeição, mas a demora pode se tornar uma injustiça. Cessa a prudência jurídica quando nos falta a paciência. Os atuais juízes e integrantes das instâncias do Judiciário aplicam a lei e não podem mudá-la ao seu bel prazer, devem se ater ao que os códigos mandam aplicar.

Aliás, essa é uma posição e esclarecimento recorrentes nos tribunais, o fato de que se reclama das penas, instâncias, recursos, sentenças, liberdades, indultos e tudo o mais que incomoda quando, de fato, é apenas o que está escrito. Logo, cabe aos legisladores mudarem o que vem sendo aplicado.

Agilizar, encurtar caminhos, recursos, instâncias e tirar o pó que anula muito do trabalho da Justiça é tarefa conjunta da sociedade, porém, liderada pelos magistrados, que são os doutos na matéria. O Direito é o reflexo dos usos e costumes da sociedade, sabe-se, mas cabe ao Congresso normatizar o que os juízes aplicarão logo adiante, nos tribunais e no julgamento dos processos que lhes chegam às mãos, como foi feito no chamado mensalão e, agora, ao final das investigações, com certeza ocorrerá no caso do popular petrolão. Condenar as investigações e os juízes que as conduzem é uma, aí sim, injustiça. Então, que a Justiça continue a bradar o seu poder em prol da sociedade. É isso que o povo quer, sempre.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

PAI É CONDENADO A INDENIZAR MULHER OFENDIDA POR FILHO EM REDE SOCIAL


FOLHA.COM. 16/04/2015 02h00


PAULA SPERB
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
EM CAXIAS DO SUL (RS)


Ao ver que um amigo havia publicado no Facebook uma foto com uma "mulher mais velha", Bruno (nome fictício), 11, não pensou duas vezes. "Ela fica com todo mundo", escreveu. "Vale R$ 1,99".

Quatro anos depois, a conta sobrou para o pai do garoto, condenado a indenizar em R$ 5.000 a mulher ofendida.

Advogado, ele ainda tentou recorrer, mas seu pedido foi indeferido pela Justiça gaúcha em 27 de março.

O pai desistiu de brigar na Justiça e afirma que a conta "está saindo baratíssima", porque, por outro lado, o filho "se transformou em um menino fora de série, comportado".

"A internet é uma arma apontada contra nós mesmos", lamenta. Bruno também foi punido, na esfera penal, e terá de cumprir quatro dias de trabalho comunitário.

"Foi uma bobagem dele por ciúmes do outro [amigo], que estava namorando. Ele quis criticar o colega, mas, em vez disso, falou aquilo de 'R$ 1,99'", disse o pai. A mulher era maior de idade na época da postagem, e o amigo tinha entre 15 e 16 anos.

OBRIGAÇÃO DOS PAIS

A juíza Glaucia Dipp Dreher, relatora do recurso, diz que a decisão facilitará que casos semelhantes também sejam punidos.

"Esses abusos [nas redes sociais] estão sendo coibidos. Não para casos de meras declarações, mas sim quando há prova de que os comentários não ficaram restritos entre as partes e alcançaram a opinião pública", diz a juíza.

No caso de Bruno e do pai, pesou o fato de morarem em uma cidade de apenas 7.000 habitantes no Rio Grande do Sul. A postagem do garoto repercutiu, e a defesa alegou que o estrago à imagem da mulher foi grande.

Para Patrícia Montemezzo, professora do curso de direito da Universidade de Caxias do Sul, essas situações estão cada vez mais comuns.

"Às vezes, eles [os pais] não têm como controlar 100% o que os filhos postam, mas é dever", diz, ressaltando que a responsabilização dos pais pelas infrações dos filhos está prevista no Código Civil.

O advogado da mulher, Ayrton Marques Portela Lopes, disse que sua cliente apagou o perfil no Facebook. Segundo ele, a vida dela "mudou muito" depois que um jornal local noticiou o fato.

A Folha não publica o nome dos envolvidos para preservar o menino, como determina o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).

terça-feira, 14 de abril de 2015

CONDENADO A 17 ANOS DE PRISÃO POR CORRUPÇÃO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA



ZERO HORA 14 de abril de 2015 | N° 18132


JUSTIÇA OPERAÇÃO ANACONDA


Ex-juiz é condenado a 17 anos de prisão


O ex-juiz João Carlos da Rocha Mattos foi condenado pela Justiça Federal em São Paulo a 17 anos e cinco meses de prisão por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Rocha Mattos ficou célebre por ser preso em 2003 na Operação Anaconda, sob acusação de liderar um esquema de venda de sentenças na Justiça Federal.

Perdeu o cargo e foi condenado a 12 anos de prisão por corrupção e formação de quadrilha. Ficou preso até ganhar o direito ao regime semiaberto, em 2011.

A ação do Ministério Público Federal, que tramita na Justiça desde 2011, aponta que o ex-juiz recebeu valores não justificados e remeteu ilegalmente quantias para uma conta bancária na Suíça. A Procuradoria afirma que sua ex-mulher Norma Regina Emílio Cunha e o irmão dela, Júlio César Emílio, ambos também sentenciados, o ajudaram.

O inquérito revelou que a movimentação financeira passou de US$ 12 milhões em conta na Suíça vinculada a Norma e Rocha Mattos. O ex- juiz foi condenado a pagar multa equivalente a 303 salários mínimos (R$ 238,8 mil, atualmente). Norma foi condenada a 15 anos e dois meses de prisão e a multa de 257 mínimos (R$ 202,5 mil). Eles poderão recorrer em liberdade.

Júlio César teve a pena de reclusão de três anos e seis meses substituída por prestação de serviços e pagamento de R$ 10 mil a instituição indicada pela Justiça, além de multa de 60 salários mínimos (R$ 47,3 mil). O Ministério Público recorreu para que a pena dos réus seja aumentada. Rocha Mattos

quarta-feira, 4 de março de 2015

A LISTA E O SIGILO



ZERO HORA 04 de março de 2015 | N° 18091


EDITORIAL



Antes de transferir as expectativas da nação para o STF, o senhor Rodrigo Janot fez uma afirmação alentadora para quem clama por Justiça: “Quem tiver que pagar vai pagar”.Ainda vai demorar algum tempo para que os brasileiros conheçam com exatidão os nomes dos políticos e das autoridades que se beneficiaram do esquema de corrupção da Petrobras. A Procuradoria- Geral da República cumpre sua atribuição ao levar ao Supremo Tribunal Federal os inquéritos e os pedidos de investigação dos governadores, ministros e parlamentares apontados na delação premiada, mas o ministro relator Teori Zavascki terá que decidir individualmente sobre a derrubada de sigilo de cada um dos investigados, solicitada pelo procurador- geral da República. Antes de transferir as expectativas da nação para o STF, o senhor Rodrigo Janot fez uma afirmação alentadora para quem clama por Justiça: “Quem tiver que pagar vai pagar”.

Compreende-se que o sigilo seja importante para evitar que inocentes sejam injuriados antes da conclusão das investigações. Mas as apurações já realizadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público sobre a roubalheira na Petrobras evidenciam a urgência na divulgação da lista de políticos beneficiados, pois alguns desses agentes públicos têm poder para interferir na própria investigação. Pode ser o caso, por exemplo, de parlamentares integrantes da CPI criada pela Câmara Federal para investigar o episódio ou mesmo dos presidentes das duas casas congressuais, que ontem chegaram a ser apontados como integrantes da lista de suspeitos.

O sigilo alimenta as especulações e dá margem às mais estapafúrdias teorias da conspiração. Enquanto os nomes dos investigados não forem oficializados pelos órgãos competentes, o Supremo ou a própria Procuradoria-Geral de Justiça, todos os detentores de mandato ficarão sob suspeição, até mesmo porque parte expressiva dos recursos desviados, segundo os próprios denunciantes, era direcionada a partidos políticos e candidatos para financiar campanhas eleitorais.

Então, quem recebeu dinheiro ilegal terá mesmo que pagar por isso, como prevê a legislação. Porém, a tendência é de que os trâmites burocráticos empurrem os julgamentos definitivos para a próxima década. Basta lembrar que o processo do mensalão levou mais de sete anos para ser concluído. Até por isso, para que a sensação de impunidade seja atenuada pela exposição, é urgente e imprescindível que a nação conheça os nomes dos beneficiários da corrupção.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

JUSTIÇA MAIS RÍGIDA CONTRA QUEM DIFAMAR, POSTAR E COMPARTILHAR OFENSAS PELA INTERNET

G1 JORNAL HOJE, Edição de 25/02/2015



Justiça está mais rígida com quem usa a internet para difamar pessoas. Quem posta ou compartilha também é punido. Responsável pela ofensa pode pagar multa.

Neide Duarte São Paulo, SP





A justiça brasileira está mais rígida com quem usa as redes sociais e os grupos de conversas de celular para ofender, falar mal, difamar os outros. Quem posta a ofensa é punido, quem compartilha é punido e quem simplesmente entra na página e concorda com o que viu também é punido. Já tem casos em que a vítima ganhou uma indenização de R$ 20 mil de todos os envolvidos.

O mundo que se exibe numa tela, onde a vida é meio de verdade, meio de mentira, meio civilizada, meio selvagem, e cada um diz o que quer acreditando estar livre de qualquer conseqüência, a cada dia fica mais parecido com o mundo real.

Nos últimos seis anos passaram pela justiça brasileira mais de 500 casos de vítimas de ofensas virtuais. Na grande maioria quem ofendeu foi julgado criminalmente e, além disso, pagou uma multa de R$ 20 mil a R$ 30 mil.

Quem responde pelo crime virtual? Em primeiro lugar, o responsável pela internet naquele computador.

“Como no caso de automóveis, aquele que vai responder se não puder dizer que foi outra pessoa e apresentar, é o dono do veículo que tem identidade amarrada à placa o carro. A mesma coisa acontece na internet. Em termos de resultados para isso é que a internet gera mais provas. Está tudo documentado”, diz a advogada especialista em crimes virtuais, Patrícia Peck.

A publicitária Viviane Teves sabe disso e pretende entrar na justiça por causa de estranhas mensagens que vem recebendo. Ela foi estuprada, dez anos atrás e agora resolveu contar essa história numa rede social, como forma de alerta para outras mulheres.

“Deu meia-noite e eu comecei a receber mensagens no celular: ‘parabéns pelos 10 anos de estupro, espero que seja estuprada novamente, só vim aqui para te dar parabéns’”, conta.


“Alguém começa uma piada, uma brincadeira de mau gosto e as outras pessoas curtem e começam a compartilhar isso achando que 'tudo bem, não vai me acontecer nada'. Mas não é assim. Todos os que se juntam na ofensa à uma pessoa, respondem junto com a pessoa que publicou aquele conteúdo”, explica a advogada.

Uma menina de 11 anos está sofrendo há alguns anos com ofensas de colegas de classe, pessoais e nos últimos tempos virtuais. Este ano além do grupo da rede social, os colegas criaram um grupo no celular.

“Conversava das lições tudo. Aí depois, a gente entrava num assunto começava a me chamar de chata, de gorda, de monstra”, conta a menina.

“Pretendo marcar com pais dessas crianças que fazem isso com minha filha: para pararem que a gente sabe onde isso acaba... Em depressão. Ela não vai querer mais estudar por causa disso. E coisas piores. A gente vê isso na família”, fala a mãe da menina.

“A internet promove uma certa covardia. É público, mas acaba sendo de uma forma, pelas costas, com requinte de maldade. Hoje crimes tipificáveis pelo Código Penal Brasileiro tem sido o de difamação, que seria você expor a honra, a imagem de uma pessoa pela internet, e esse crime pode estar associado a outros: incitação ao crime, por exemplo, a ameaça. Se decidir ir para justiça tem prova para punir essas pessoas”, completa a advogada.

domingo, 22 de fevereiro de 2015

JUSTIÇA DETERMINA BLOQUEIO DE BENS DE EX-GOVERNADOR ACUSADO DE IRREGULARIDADES


REVISTA ÉPOCA  20/02/2015 18h54


Justiça determina o bloqueio dos bens de Agnelo Queiroz. Ex-governador do Distrito Federal é acusado de irregularidade em reforma de autódromo e na contratação da Fórmula Indy

REDAÇÃO ÉPOCA


Agnelo Queiróz (Foto: Wilson Dias/ABr)

A Justiça do Distrito Federal determinou na tarde desta sexta-feira (20) o bloqueio dos bens do ex-governador Agnelo Queiroz, do PT, e de mais cinco pessoas. Segundo a decisão, serão bloqueados todos os bens dos réus até um limite de R$ 37,2 milhões, somado entre os seis.

O Ministério Público acusa Agnelo pela irregularidade no contrato de transmissão da Fórmula Indy. Segundo a denúncia, Agnelo fechou um contrato com a empresa transmissora do evento esportivo em março de 2014. A acordo, no entanto, foi assinado sem a presença de testemunhas e nunca foi publicado no Diário Oficial, o que, para a promotoria, é um indício de irregularidade.

Além disso, o governo do Distrito Federal fechou um convênio para transferir recursos da Terracap para a Novacap. As duas empresas são públicas e controladas pelo DF. Com o convênio, a Novacap lançou um edital para contratar uma empresa para reformar o autódromo Nelson Piquet. Esse processo de licitação está sob suspeita de superfaturamento de R$ 35 milhões.

Ao portal G1, a defesa de Agnelo Queiroz disse que o ex-governador ainda não foi notificado e que, assim que tomar conhecimento do teor da decisão, deverá recorrer.

Além de Agnelo, a Justiça bloqueou os bens de Maruska Lima de Sousa Holanda, ex-presidente da Terracap; André Duda, ex-secretário de publicidade institucional do GDF; Jorge Antônio Ferreira Braga, ex-diretor financeiro da Terracap; Sandoval Santos, ex-chefe da assessoria de comunicação da Terracap; e Deni Augusto Pereira, ex-advogado-geral da Terracap.

A SOLUÇÃO PARA A CORRUPÇÃO TEM DE SER A PRISÃO


REVISTA ÉPOCA 06/12/2014 10h15

Fausto De Sanctis: "A solução para a corrupção tem de ser a prisão". Pioneiro no julgamento de escândalos de crimes financeiros, o desembargador defende a delação premiada e a dureza na punição aos criminosos de colarinho branco

GUILHERME EVELIN E PEDRO MARCONDES DE MOURA



VINGADO
Fausto De Sanctis, em seu gabinete. Ele diz que o mensalão mudou o Judiciário (Foto: Filipe Redondo/ÉPOCA)

Em seu gabinete no Tribunal Regional Federal de São Paulo, o desembargador Fausto De Sanctis acumula livros sobre o combate ao crime organizado. O tema é uma obsessão dele. Aos 50 anos, Sanctis foi responsável por julgar na primeira instância duas das mais controversas operações de combate à corrupção no país. Na Satiagraha, expediu a prisão do banqueiro Daniel Dantas. Na Castelo de Areia, julgou a construtora Camargo Corrêa. As sentenças, reformadas por tribunais superiores, lhe valeram a fama de linha dura e uma série de procedimentos administrativos. Em sua opinião, é uma situação bem diferente do que ocorreria hoje. O motivo: o julgamento do mensalão pelo STF.

ÉPOCA – No último mês, houve a prisão de dirigentes de grandes empreiteiras e operadores de partidos políticos. Fatos antes inimagináveis. Isso é resultado de evolução institucional?
Fausto De Sanctis – As varas da Justiça especializadas em crimes econômicos, criadas lá trás, foram a grande mudança. Isso é reconhecido internacionalmente. Ocorreu uma especialização dos atores do processo de persecução penal. Depois de 2003, houve também uma qualificação da Polícia Federal. O Ministério Público e os juízes especializados também se aperfeiçoaram. Isso permitiu que esses processos, antes difusos e espalhados pelas varas, fossem concentrados nas mãos de pessoas que puderam lhe dar fluidez. Agora, um divisor de águas, sem dúvida, foi o mensalão.

ÉPOCA – Que consequências teve o julgamento do mensalão?
Sanctis – Foi o grande caso em que o STF referendou, com suas decisões, muito do que se criticava no trabalho das varas. Antes do mensalão, havia um desencorajamento geral de quem estava à frente do combate de qualquer crime econômico. Houve uma paralisia da Polícia Federal e um desestímulo aos juízes federais criminais. Viam que nada adiantava. Conheço a seriedade do trabalho do juiz Sergio Moro. Ele mesmo chegou a revelar, uma vez, certo desestímulo. O julgamento do mensalão deu ânimo a todos. Não era possível que a verdade dos fatos fosse renegada. Houve uma apreciação com base na realidade levada ao STF, que atuou não apenas na abstração constitucional.

ÉPOCA – O juiz Moro é tachado de ativista, a mesma crítica feita ao senhor nas operações Satiagraha e Castelo de Areia.
Sanctis – No Brasil, quando o juiz atende a todo e qualquer pedido da defesa, ele é garantista. Ao revés, quando aplica o direito aos fatos, em desfavor do réu, é tido por arbitrário, autoritário. Não é nada disso. Está apenas cumprindo seu papel. O ativismo é uma crítica para desqualificar, que muitos traduzem assim: “Ah, esse juiz quer colocar todo mundo na cadeia, e cadeia não é solução para nada”. É uma falácia. O Brasil assina as convenções internacionais e as descumpre internamente. Crime de corrupção precisa ter como resultado a prisão.

ÉPOCA – Muitos juristas afirmam que a melhor punição aos criminosos de colarinho branco não é a prisão, mas pesadas multas em dinheiro.

Sanctis – O criminoso econômico é ambicioso, tem avidez. Compensa suas ações com medidas sociais para aliviar a culpa. No caso de multa, a punição compensaria as práticas ilícitas. A solução tem de ser a prisão. Quando o Estado começar a mostrar para a sociedade, como fazem os países desenvolvidos, que os crimes têm consequência, a criminalidade começará a reduzir. Isso precisa ser feito aqui. O crime organizado sangra o Brasil – um país que só não é mais rico por causa da corrupção. Ela se difundiu de tal forma que ninguém teme mais nada.


ÉPOCA – O brasileiro é tolerante com a corrupção?
Sanctis – A sociedade brasileira é paradoxal. É severa na corrupção e totalmente tolerante na sonegação. Os dois são igualmente perniciosos. Causam prejuízos do mesmo modo aos cofres públicos. Temos de quebrar esse círculo vicioso, uma sociedade que tem certa tolerância a práticas criminosas e ilícitas. A corrupção está impregnada no Estado, a tal ponto que é quase impossível combatê-la. Mas há um método muito interessante: a delação premiada.

ÉPOCA – Muitos juristas têm restrições à delação premiada.
Sanctis – Causa-me estranheza esse tipo de argumentação. A delação premiada é um instituto consagrado. Existe há muito tempo no Brasil. Dizem que o uso dela é antiético. Isso não é verdade. A regra de que não se pode delatar é do criminoso, do delinquente, da máfia. A delação premiada é um instituto útil, porque facilita a descoberta da verdade. Também é estratégico para a defesa, ao permitir que o cliente seja beneficiado por uma conduta positiva. Os próprios advogados deveriam estimular a delação. Segundo o Código de Ética da OAB, o advogado tem o dever de atuar em favor da verdade.

ÉPOCA – Confiar na palavra de um criminoso não é arriscado?
Sanctis – É preciso ter uma cautela muito grande. Durante o combate à Máfia, as forças públicas italianas sabiam que, às vezes, a delação era usada para acertos internos das organizações. O delator é uma testemunha suspeita. O princípio de presunção da inocência do delatado tem de ser preservado. Não é porque foi delatado que é verdade. As delações só são úteis à Justiça se trouxerem elementos provando o que foi dito.

ÉPOCA – Na Operação Castelo de Areia, houve uma controvérsia em relação à delação premiada, que contribuiu para a anulação do processo pelo STJ.
Sanctis – As delações premiadas, quando foram feitas, foram desbravadoras, porque não havia regulamentação. O procedimento adotado pela 6a Vara, onde eu era titular, foi abraçado integralmente pela nova lei. Naquela época, os tribunais entendiam que o teor de uma delação premiada podia ser dado às partes. A nova lei diz que o teor não pode ser dado até a investigação acabar. Os fatos foram deturpados. No início, a Castelo de Areia envolveu delação premiada, denúncia anônima, fatos de outra operação e o acompanhamento de um suspeito de ser doleiro, que entrava e saía com malas de uma empresa. O fato é esse. Justificou uma interceptação telefônica. O STJ decidiu que não havia justificativa e considerou que houve só denúncia anônima.

ÉPOCA – Há delatores recorrentes. Isso não torna a delação uma segurança prévia para o criminoso, caso seja pego?
Sanctis – Doleiros que já foram condenados e fizeram delações no passado e novamente são investigados – quer na Lava Jato, quer em outra operação – não deveriam ser merecedores de qualquer benesse. Eles não são minimamente confiáveis. O delator tem de mostrar também, imediatamente, arrependimento. Estabeleci, nos processos em que atuei, a reparação imediata da sociedade como forma de arrependimento. Trinta e oito instituições de caridade foram ajudadas com o dinheiro da delação premiada.


ÉPOCA – O que o senhor acha das propostas de acordo com as empreiteiras envolvidas na Lava Jato para evitar a paralisia da economia?
Sanctis – Não posso tecer considerações sobre casos concretos. Por vezes, os investigados usam estratégias para se perpetuar na prática criminosa. Versões no sentido de que a prática de crimes foi motivada por coação pretérita não são delação, tampouco confissão, de modo que a invocação dessa tese se distancia da delação premiada, que implica a confissão e não a justificativa da prática criminosa. A Lei Anticorrupção prevê que o acordo de leniência só deve ser feito com a primeira pessoa jurídica a firmar o acordo, não é para todos. Os fatos praticados por essas empresas, se confirmados, são gravíssimos. As consequências previstas em lei são suspensão das atividades, perda de bens e dissolução das empresas, se for o caso. Se o objeto de uma empresa é a prática criminosa, ela deve ser encerrada. Essa tem de ser a resposta. O país não parará, ele já parou há muito tempo. Não temos sistema de saúde ou educação, estão parados! A gente só finge que eles existem.

"Se o objeto de uma empresa é a prática criminosa, ela deve ser encerrada"

ÉPOCA – O senhor dá palestras no exterior sobre lavagem de dinheiro. Qual a visão de fora sobre a corrupção no Brasil?
Sanctis – Querem saber como o Brasil trata a corrupção. Numa das palestras nos Estados Unidos, organizada pela ordem dos advogados de lá, o tema era como as empresas estrangeiras devem se comportar nos países onde a corrupção é sistêmica. Eu dizia o seguinte: a corrupção é como um ônibus. Você pode ficar do lado de fora, fechar os olhos e deixar o ônibus passar. Pode entrar e fingir que não acontece nada. Mas pode também ficar na frente dele. O ônibus vai até continuar, mas você pode diminuir a velocidade dele.

ÉPOCA – O senhor conduziu duas operações interrompidas pelas cortes superiores. Sua sensação é que conseguiu frear um pouco o ônibus ou se sentiu atropelado?
Sanctis – Não sei se consegui ter algum efeito, mas, que fiquei na frente do ônibus, fiquei. Nunca cedi à corrupção.

ÉPOCA – Por duas vezes, seu nome foi indicado pelos juízes federais para uma vaga no STF. O senhor tem vontade ser ministro?
Sanctis – Gostaria, obviamente, de ir ao Supremo. Não escondo. Não acho conveniente ou delicado fazer qualquer tipo de pressão ou campanha. Mas o recado tem de ser dado: eu gostaria. Humildemente, acho que teria condições de assumir um cargo de tamanha magnitude. Mas quero que a presidente fique à vontade para escolher quem ela achar melhor. Estou bem onde estou.

O BRASIL ESTÁ SE PASSANDO A LIMPO


REVISTA ÉPOCA 20/02/2015 20h42

Luís Roberto Barroso: “O Brasil está se passando a limpo”. O ministro do Supremo, relator do mensalão, diz que o Tribunal está pronto para enfrentar os processos contra os políticos do petrolão e defende o fim do foro privilegiado

DIEGO ESCOSTEGUY



DEPURAÇÃO O “novato” Barroso lidera, no Supremo, as mudanças que visam a tornar as punições mais efetivas (Foto: Sergio Lima/Folhapress)


O ministro Luís Roberto Barroso nem completou dois anos no Supremo, mas já fala com a convicção e a serenidade dos veteranos. Como a presidente Dilma Rousseff hesita há meses a nomear o sucessor de Joaquim Barbosa, Barroso ainda é “o novato”, na definição do veteraníssimo Marco Aurélio Mello, sempre mordaz. As opiniões assertivas e logicamente impecáveis de Barroso, reconhecido como um dos maiores constitucionalistas do Brasil, incomodam alguns dos ministros do Supremo, um tribunal de notáveis – e de notáveis vaidades. Nesta entrevista, Barroso, que passou a relatar o mensalão após a aposentadoria de Barbosa, reflete com cauteloso otimismo sobre a situação difícil do país, explica como o Supremo está tentando punir os poderosos e defende o fim do foro privilegiado para parlamentares e ministros.

ÉPOCA – O brasileiro convive com uma economia estagnada, um megaescândalo de corrupção na Petrobras e um governo que parece paralisado por tudo isso. Quão profunda é a crise pela qual passamos?
Luís Roberto Barroso – O Brasil está vivendo uma crise de amadurecimento. Decorre de uma cidadania que se tornou mais consciente, mais exigente e, de certa forma, mais participativa. E isso é bom. O problema é que as instituições e os serviços públicos ainda não conseguiram se ajustar adequadamente a essas novas demandas. Mas nós avançamos. Para perceber isso, é preciso enxergar o Brasil em três planos distintos: um plano político, um plano econômico e um plano institucional. No plano político, temos vivido as turbulências de uma eleição que dividiu o país de uma maneira muito relevante – não apenas dividiu, mas o polarizou. As pessoas saíram ressentidas das eleições: um lado ressentido com o outro. Existe a turbulência econômica, reconhecida por todos. Porém, do ponto de vista institucional, o país vai muito bem. Nós temos democracia e nós temos respeito às regras do jogo. Ou seja, amadurecemos institucionalmente.


ÉPOCA – Não é pouco? No plano concreto, muitas pessoas estão, em resumo, infelizes com a vida que levam.
Barroso – Pode parecer pouco, mas o Brasil sempre foi historicamente o país do golpe de Estado, da quartelada, da quebra da legalidade constitucional. E nessa matéria nós superamos todos os círculos do atraso. Já vivemos há 30 anos com estabilidade institucional – apesar de muitas crises, desde a destituição de um presidente da República até o abalo representado pela Ação Penal 470 (o mensalão).

ÉPOCA – Pensar no longo prazo, seja no passado ou no futuro, nos ajuda a pôr os fatos políticos no devido contexto. Mas e o presente?
Barroso – No longo prazo, são as instituições que contam. São elas que mantêm o estado de direito. A política se move por objetivos de curto prazo; a economia, muitas vezes, também. As instituições, no presente, somos nós todos. O Brasil tem progredido muito do ponto de vista institucional. Há muitas coisas a mudar, mas há coisas boas a celebrar.

ÉPOCA – Essa maturidade institucional será suficiente para suportar os possíveis choques que se avizinham, diante dessa combinação de crises?
Barroso – Não tenho nenhuma dúvida. Os Poderes da República vivem um momento de especial equilíbrio. No Executivo, a presidente foi eleita democraticamente, e nós já não vivemos no Brasil aquela tradição de hegemonia autoritária do Executivo. O Legislativo vive uma certa afirmação de autonomia. O Judiciário deixou de ser aquela torre de marfim inacessível. Passou a ser um bom garantidor de direitos individuais e de proteção às instituições. Existem disputas pontuais, mas isso existe em todas as democracias.

ÉPOCA – Casos de corrupção, como o desvendado na Operação Lava Jato, passam a sensação de que prevalece uma degradação institucional no Brasil. É uma impressão correta?
Barroso – Acho que o Brasil está se passando a limpo. Quando eu falo de ética, me refiro tanto à ética pública quanto à privada. É preciso chamar a atenção para a existência de uma certa moral dupla, em que as pessoas exigem o que nem sempre estão dispostas a dar. A mudança ética no Brasil tem de ser pública e privada.


ÉPOCA – A expressão “passar a limpo” já foi muito usada, e o Brasil continua, aparentemente, sujo. Não há um certo moralismo paralisante nela?
Barroso – É inegável que temos avançado na depuração ética. Às vezes não na velocidade que a gente gostaria, mas na direção certa. Vou dar um bom exemplo. Quando a apuração da Ação Penal 470 começou, em 2005, havia um grande ceticismo. Ninguém achava que aquilo fosse dar em coisa alguma. A verdade é que resultou em penas relevantes de prisão para mais de duas dezenas de pessoas, entre políticos importantes e empresários importantes. Portanto, só isso já foi uma mudança de patamar no país.

ÉPOCA – O clichê de que o brasileiro tem memória curta procede, então?
Barroso – Na vida, as pessoas realizam os ganhos rapidamente, mas remoem as perdas durante muito tempo. A partir do momento em que se teve o ganho, no caso a condenação efetiva de muitas pessoas, vem o passo seguinte: “Ah, mas ficaram presas por pouco tempo”. Já é o dia seguinte de uma mudança de paradigma. Se ficaram presas por pouco tempo, isso se deve às leis atuais – e as leis têm de valer para todos. O interessante é que nós fomos do ceticismo de que não haveria qualquer punição a uma certa insatisfação de que a punição que existiu foi menos duradoura do que se imaginava. A prova de que nós mudamos de patamar é que agora, quando se discute o assim chamado petrolão, ninguém mais está achando que não vai dar em nada, que ninguém vai ser punido, que ninguém vai ser preso.

ÉPOCA – O julgamento do mensalão realmente mudou o Supremo e os processos criminais no Brasil? Há quem tema que o Supremo ponha fim à Lava Jato.

Barroso – Não é o caso. A impunidade não é mais a regra. Na Ação Penal 470, houve algumas mudanças importantes. No caso de crime de peculato, que é o desvio de dinheiro, para progredir de regime prisional o condenado tem de devolver o dinheiro desviado. Porque a condenação é uma pena de prisão mais uma multa. Também tenho me empenhado para moralizar a prisão domiciliar. Prisão domiciliar é prisão. Não pode viajar por aí. É importante moralizar a prisão domiciliar: ela é uma alternativa humanitária às condições degradantes dos presídios. O país está um pouco menos tolerante com infrações penais de uma maneira geral, inclusive a dos poderosos.


ÉPOCA – Com as denúncias de políticos no petrolão, o Supremo será exigido mais uma vez. O Tribunal dará conta?
Barroso – Não há por que duvidar. O Supremo tem contribuído muito para uma arrumação do Direito Penal no Brasil. O Direito Penal deve ser moderado, mas deve ser sério. Porque, numa democracia, uma repressão penal proporcional, respeitado o devido processo penal, é indispensável para a vida civilizada – e para a própria proteção dos direitos fundamentais das pessoas. Temos tido avanços no sistema penal. Não com a construção de um estado policialesco, mas com algumas mudanças que quebram esse paradigma de impunidade.

ÉPOCA – Por exemplo?
Barroso – No Supremo, nós passamos do plenário para as turmas o julgamento dos processos criminais. Pode parecer pouco, mas se desobstruiu o plenário. Nós julgamos, em 2014, 35 ações penais e 12 julgamentos finais. Isso apenas na primeira turma, em que atuo. É mais do que o plenário havia julgado em muito tempo. Como essas ações que chegam ao Supremo são quase todas contra parlamentares, estamos superando a impunidade que prevalecia. Uma segunda mudança importante, também para evitar a impunidade, diz respeito ao parlamentar que renuncia ao mandato para fugir do julgamento no Supremo. Entendemos que esse estratagema não pode valer. O parlamentar, mesmo se renunciar, será julgado pelo Supremo.

ÉPOCA – Se a lei vale para todos, não seria o caso de acabar com o foro privilegiado?
Barroso – Eu acho que o capítulo final dessa história será uma redução drástica do foro. O foro privilegiado deve existir somente para presidente da República, para o vice-presidente e para os demais chefes de Poder. A médio prazo, eu seria um defensor dessa mudança. Depende do Congresso. Minha proposta é que se crie uma vara federal em Brasília apenas para julgar esses casos. Caberia recurso ao Supremo. Certamente acho muito ruim que isso fique no Supremo.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

O JUIZ MORO



ZERO HORA 13 de fevereiro de 2015 | N° 18072



MOISÉS MENDES*



A grande interrogação em torno do desfecho da Operação Lava-Jato é esta: até onde irá o juiz federal Sérgio Moro para que se cumpra por completo a elucidação do que aconteceu na Petrobras?

Para alguns, elucidar é punir apenas o período do PT no governo. Para outros, o juiz terá sido parcial se não voltar ao tempo do PSDB no poder.

O juiz Moro tem a confiança de quem acha que irá pegar apenas o PT. Tanto que tucanos e simpatizantes o exaltam com vigor na internet como o novo Joaquim Barbosa, que fez o serviço no julgamento do mensalão.

A esperança dos petistas se sustenta na certeza de que Moro não pode ser um novo Barbosa, que triturou os corruptos do partido e, quando achavam que pegaria os corruptos dos outros, despediu-se do Supremo com uma aposentadoria precoce. O PT acha que, se escapou do julgamento do mensalão mineiro no Supremo, o PSDB não pode escapar agora do juiz do petrolão.

Esse é o duelo da Operação Lava-Jato. Os velhos corruptos alegam que roubaram pouco e há muito tempo. Os novos querem saber se algum ovo da Petrobras não foi chocado em ninhos tucanos. A maioria do povo, sem partido, quer que ambos sejam enjaulados.

Esta semana, um empreiteiro delator finalmente contou que o cartel roubava desde o início dos anos 90, repartindo obras, superfaturando e pagando propinas. Um ex-gerente jurídico da Petrobras repetiu o mesmo.

Confirmou-se a suspeita óbvia de que a Petrobras foi raptada pelos empreiteiros. Cerveró, Cunha, Barusco e Duque eram seus capachos.

Não é mais indício, é a confissão de quem comandava o esquema. Foi-se a tese de que grupos poderosos eram vítimas de achacadores. Eles montaram a quadrilha.

Agora, é esperar para ver até onde irá o juiz Moro. Os políticos com foro privilegiado não são da sua alçada, estão sob os cuidados do Supremo. Se não quiser continuar seu trabalho catando laranjas pequenas, como essa empresa de Santa Catarina flagrada na semana passada, Moro terá de ir mais fundo.

E ir mais fundo é voltar no tempo e farejar os rastros do cartel nos anos 90. Os delatores devem estar loucos para ajudar.

Esperemos para ver se o juiz Moro fará esse caminho de volta, para que depois não digam que não recolheu laranjas graúdas, e com penas coloridas, deixadas lá atrás.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

A CADA UM, O QUE É SEU





ZERO HORA 11 de fevereiro de 2015 | N° 18070



FÁBIO DUTRA LUCARELLI*



Em 2014, a 20ª Vara Federal do TJ-RS criou o projeto “Entregando a cada um o que é seu”, iniciativa pioneira no Judiciário Federal, que abrange processos nos quais estão pendentes a destinação de valores em dinheiro resultantes de ações contra a Previdência Social abertas por cidadãos comuns.

Descobrimos que milhares de processos se encontravam arquivados com valores depositados pelo INSS, quantias referentes a pagamentos a autores de ações vitoriosas que, por inúmeras razões, não souberam do resultado. Sabendo que pessoas, em geral de parcas condições financeiras – mais que isto, que eram donas daquelas quantias –, estivessem alheias ao resultado do seu processo, começamos a adotar práticas que possibilitassem que os montantes fossem efetivamente entregues a quem pertencia.

Passamos a consultar bancos de dados como INSS e Receita Federal. Buscamos localizar as pessoas – que muitas vezes eram comunicadas até por telefone da existência de valores – ou, caso falecidas, seus sucessores eram intimados para que tomassem ciência do processo e dos valores.

Focando no objetivo final de entregar os valores, a prática motivou a equipe da Vara pelo retorno alcançado e, desde fevereiro de 2014, já entregamos aos segurados da Previdência ou a seus herdeiros mais de R$ 800 mil, sendo outros R$ 300 mil devolvidos aos cofres públicos, pois estavam indevidamente depositados.

Além de reconhecer as práticas inovadoras e promover os avanços do Judiciário, o Prêmio Innovare aumenta a motivação pessoal dos envolvidos e agrega visibilidade à prática. Estar entre os três premiados nos permitiu ter consciência de que o trabalho realizado é efetivamente relevante para a Justiça e para a vida do brasileiro.

Há um longo e tortuoso caminho a ser percorrido até a resolução final dos problemas, sendo a inovação e comprometimento com o resultado fatores preponderantes para que o ponto de chegada seja aquele planejado no início da caminhada.

*Juiz federal da 20ª Vara Federal de Porto Alegre