sexta-feira, 18 de março de 2016

NOMEAÇÃO DE LULA "EMBARAÇA" A JUSTIÇA?



ZERO HORA 18 de março de 2016 | N° 18476


ARTIGOS


ANDRÉ CALLEGARI*



Ao contrário do sistema norte-americano, não há previsão no Código Penal brasileiro para a prática de obstrução da Justiça. Todavia, a questão tem levantado dúvidas após a nomeação do ex-presidente Lula para o cargo de ministro da Casa Civil, em função do andamento da Operação Lava-Jato e da investigação do ex-mandatário da República na primeira instância.

Em primeiro lugar, deve-se esclarecer que a nomeação do ex-presidente para aquele cargo não impede o prosseguimento das investigações na maior operação contra a corrupção deste país, ocorrendo tão somente a alteração do foro competente para julgá-lo: o Supremo Tribunal Federal. Na prática, significa que Luiz Inácio Lula da Silva passará a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República, através da figura de Rodrigo Janot, e, caso seja denunciado por algum delito, o ministro Teori Zavaski e seus pares – dentre eles, o desafeto do governo Gilmar Mendes – estariam aptos a julgá-lo.

Há, no entanto, um ponto a ser esclarecido na polêmica nomeação do ex-presidente à Casa Civil: o artigo 2º, § 1º, da Lei 12.850/13 – Lei das Organizações Criminosas –, criminaliza quem impede ou obstrui de alguma forma investigação de infração penal aos envolvidos em organizações criminosas. A pena para esta prática é de três a oito anos de reclusão.

Assim, é possível processar alguém que impede ou embaraça uma investigação criminal, desde que os fatos demonstrem que foi premeditada a nomeação de Lula para a Casa Civil a fim de escapar do juiz federal Sergio Moro e, não menos importante, que fazia/faz parte de organização criminosa. Portanto, há de ser comprovado que há uma organização criminosa atuando na cúpula do Palácio do Planalto e que a mesma está obstruindo a Justiça.

O problema recairá sobre a interpretação do que significa impedir ou embaraçar uma investigação criminal, conforme rege aquela lei. O fato de nomear alguém que tem o privilégio de foro significa embaraçar a investigação? A finalidade do ato da Presidência era esse? Somente o tempo e o STF esclarecerão. Por enquanto, somente teses poderão ser levantadas.

Advogado*

segunda-feira, 14 de março de 2016

MORO VIRA HEROI DAS MULTIDÕES



ZERO HORA 14 de março de 2016 | N° 18472



JUIZ RESPONSÁVEL PELA LAVA-JATO recebeu homenagens e declarações de apoio país aforaO juiz federal Sergio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato, em Curitiba (PR), foi um dos personagens mais exaltados pelos manifestantes que tomaram as ruas ontem.

Com faixas, gritos de guerra e até máscaras com o rosto de Moro, brasileiros vestidos de verde e amarelo saudavam-no como herói.

– É um orgulho nacional. Representa tudo que a gente quer –, disse Ana Lúcia Magela, na Avenida Paulista, em São Paulo, ostentando um dos cartazes de apoio.

Uma imagem do juiz estampou também o carro de som do grupo Revoltados Online, que puxava aplausos para Moro.

No Rio de Janeiro, “Mais Moro, menos Dilma”, “Somos todos Moro”, “Viva Moro” e “Eu amo (representado por um coração) Moro” foram algumas das mensagens expostas em cartazes e camisetas ao longo da orla de Copacabana.

Um grupo de 35 pessoas chamou atenção por usar uma mesma camiseta amarela, identificada como #morobloco, um trocadilho do nome do juiz com Monobloco, um dos mais populares blocos de Carnaval do Rio.

Os atores globais Marcelo Serrado e Susana Vieira estavam entre os seguidores do #morobloco.

– Estou aqui como cidadão. Somos a favor do Moro e das investigações da Lava-Jato – afirmou Serrado.

Apesar das críticas à atual situação do país, o ator faz ressalvas à possibilidade de afastamento da presidente Dilma Rousseff.

– Se for comprovada alguma irregularidade, sou a favor do impeachment. Mas não sei dizer se existem motivos que justifiquem a saída dela neste momento .

– Estamos aqui a favor do Moro e da Polícia Federal. A hora é de mobilização nacional contra a corrupção – acrescentou Susana Vieira.

Em Curitiba, sede das investigações, manifestantes colocaram nas ruas 10 mil máscaras em homenagem ao juiz federal. A todo momento, manifestantes gritavam, no carro de som, referências ao juiz

– Gostei muito de uma frase que ouvi aqui: ‘vamos mororizar o país – disse, entre risos, Veridiana Navajas, que usava máscara de “japonês da Federal”.

FIQUEI TOCADO, COMENTOU MORO

Em nota divulgada ontem, Moro agradeceu as homenagens:

“Fiquei tocado pelo apoio às investigações da assim denominada Operação Lava-Jato. Apesar das referências ao meu nome, tributo a bondade do povo brasileiro ao êxito até o momento de um trabalho institucional robusto que envolve a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e todas as instâncias do Poder Judiciário”.

No mesmo texto, Moro disse considerar “importante que as autoridades eleitas e os partidos ouçam a voz das ruas (...), reforçando nossas instituições e cortando, sem exceção, na própria carne”. Escreveu ainda que “não há futuro com a corrupção sistêmica que destrói nossa democracia, nosso bem-estar econômico e nossa dignidade”.

terça-feira, 8 de março de 2016

ENTRE A IMPUNIDADE E O ARBÍTRIO



ZERO HORA 08 de março de 2016 | N° 18467


EDITORIAIS



Descontados alguns excessos ideológicos e emocionais, o debate sobre a condução coercitiva do ex-presidente Lula para prestar depoimento à Operação Lava-Jato é oportuno para dar ainda mais transparência e legitimidade à investigação do maior escândalo de corrupção da história do país. Nesse contexto, o desafio das autoridades é encontrar o meio-termo entre a histórica impunidade dos poderosos, que revolta e estimula um clamor até por justiçamento, e o arbítrio, que é sempre um risco quando agentes públicos são investidos de poderes punitivos.

Como bem alertou ontem o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, o Judiciário não pode exercer papel político nem se deixar levar por emocionalismos. O magistrado registrou sua perplexidade com a generalização das prisões preventivas e com a utilização desse recurso para “fragilizar os presos” e induzi-los à delação premiada. Não se trata de crítica direta à maneira como o juiz Sergio Moro vem comandando a maior ação de depuração ética já empreendida no país, mas, sim, de um apelo à preservação de princípios democráticos.

O caso específico da condução coercitiva de Lula é exemplar. Se o ex-presidente estava disposto a colaborar – isto não estava tão claro assim, pois ele já driblara outras convocações com recursos judiciais –, não havia mesmo necessidade de levá-lo “sob vara”, como se diz na linguagem jurídica. Porém, essa dúvida de natureza jurídica e política não pode servir de pretexto para encobrir as suspeitas que recaem sobre o investigado, que vão da ocultação de patrimônio às relações promíscuas com empreiteiros envolvidos no esquema de subtração da Petrobras.

Cabe, portanto, esclarecer bem que a Operação Lava-Jato é saudável para o país, tende mesmo a se transformar num marco de restauração ética na política e na vida pública. Mas os limites da democracia e dos direitos humanos têm que ser observados.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O Judiciário não pode se portar como um poder "bonzinho", fraco e moderador, mas como um poder forte e coercitivo para que a lei, a justiça, as obrigações, a autoridade e os limites do direitos sejam respeitados.