sexta-feira, 4 de abril de 2014

OBJETIVO ERA PRESERVAR MÃE E FILHO



ZERO HORA 04 de abril de 2014 | N° 17753


TAÍS SEIBT | TORRES



DECISÃO JUDICIAL. Objetivo era preservar mãe e filha, diz médico



Na manhã de ontem, a obstetra Joana de Araújo, que realizou a cesariana de Adelir, recebeu a reportagem de Zero Hora em seu consultório, em uma clínica particular de Torres. A médica, no entanto, preferiu não conceder entrevistas e indicou o diretor técnico do Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, Marcelo Fagundes, para dar esclarecimentos sobre o caso.

Fagundes destacou que, como plantonistas, as médicas que atenderam Adelir não recebem remuneração por procedimento realizado. Deste modo, segundo ele, o único interesse da equipe em levar o caso para a Promotoria de Justiça era preservar a saúde da mãe e da criança.

– Sentimos que a mãe não tinha compreendido os riscos que estava correndo e fomos procurar apoio – justificou o médico.

Além das questões técnicas apresentadas no laudo para embasar a recomendação da cesariana, Marcelo Fagundes ainda mencionou limitações estruturais que tornavam arriscado atender à vontade da mãe de fazer um parto natural. Entre elas estavam a ausência de uma UTI neonatal na cidade, para o caso de alguma complicação durante o parto.

Corroborou para o caso ser levado à Promotoria de Justiça o fato de o pai não ter acompanhado a primeira consulta, na qual apenas a doula estava presente.

Sobre o fato de o pai ter sido impedido de assistir ao parto, o médico argumenta que ele tem o direito de ver, mas o obstetra pode não permitir a entrada do pai na sala de cirurgia se houver risco ao procedimento.

Segundo Fagundes, como Guimarães estava muito agitado, a equipe entendeu que era melhor ele ficar do lado de fora.


OS ARGUMENTOS PARA A INTERVENÇÃO

O diretor técnico do hospital apresentou cinco argumentos que confirmam a posição fetal podálica (em pé) no caso de Adelir, reforçando a contraindicação do parto normal

- Ecografia de 28 de fevereiro.
- Exame obstétrico de toque realizado pela obstetra Andréia de Castro às 16h do dia 31 de março.
- Ecografia também realizada no dia 31 de março.
- Exame obstétrico de toque realizado pela obstetra Joana de Araújo na madrugada de 1º de abril, quando a gestante foi reconduzida ao hospital.
- Testemunho do anestesista, do pediatra e da técnica de enfermagem, além da própria médica que realizou o parto por cesariana em Adelir.



Após cesárea, Adelir processará hospital

Ao voltar para casa, mãe revela frustração por não ter feito parto normal



Em uma chácara na localidade de Campo Bonito, zona rural de Torres, os irmãos de Yuja Kali esperavam a chegada da bebê no começo da tarde de ontem. A caçula surgiu no colo da mãe, Adelir Lemos de Goes, 29 anos, dormindo, alheia ao alvoroço que se criou em torno da cesariana que a trouxe ao mundo.

De volta para a residência de madeira, revestida com lona – ainda em construção pelo marido, o técnico em manutenção industrial Emerson Guimarães, 41 anos –, Adelir continuava imersa em uma confusão de sentimentos. Após quase três dias hospitalizada e sem ter conseguido amamentar a filha recém-nascida, ela sorria ao ver a pequena dormindo, sob o olhar curioso dos irmãos mais velhos.

Mas, ao recordar os momentos que antecederam o parto, a aparente expressão de alívio dava lugar novamente à revolta e à indignação.

– Não era uma questão de vaidade. Era uma questão de saúde. Eu nunca descartei a cesariana, mas queria que essa fosse a última alternativa – desabafou Adelir.

Na madrugada da última terça-feira, ela foi retirada de casa por policiais e conduzida em uma ambulância até o Hospital Nossa Senhora dos Navegantes. A ação foi realizada em cumprimento a uma ordem judicial expedida horas antes, depois de o hospital pedir a intervenção da Procuradoria de Justiça no caso, já que a mãe havia discordado da recomendação médica de fazer a cesariana.

Na 34ª semana de gestação, casal contratou uma doula

Sentada no pátio, ao lado de um pequeno santuário a Kali – a padroeira dos ciganos homenageada no nome da bebê –, Adelir contou que seus outros dois filhos nasceram de cesariana. Angelo, de sete anos, estava com 39 semanas de gestação quando a obstetra recomendou a cirurgia, e Adelir concordou. Flora, de dois anos, estava com 41 semanas quando Adelir foi ao médico. O diagnóstico foi de que os batimentos cardíacos do feto estavam caindo, mas a gestante não tinha contrações – a saída seria a cesárea. Novamente, ela acatou a prescrição médica.

O que mudou desta vez foi que Adelir procurou se informar mais a fundo sobre o parto natural humanizado. Quando estava na 34ª semana de gestação, encontrou pela internet a doula Stephany Hendz, assistente de parto que a apoiaria física e emocionalmente no parto normal Adelir se preparou para a hora H. Leu livros, viu filmes, participou de grupos de apoio, mas não conseguiu realizar seu desejo.

Além de a cirurgia ter sido feita contra a sua vontade, a mãe demonstra descontentamento com o fato de o pai da menina ter sido impedido de assistir ao parto. Por isso, o casal pretende ingressar com processo contra o hospital.

– Era a última chance que ele (Emerson) tinha de ver um filho nascer, porque agora ele vai fazer uma vasectomia. E eu também não vou mais poder ter outros filhos. Nunca vou ter um parto natural – lamenta Adelir.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Há juízes no Brasil. Há fontes de justiça no Brasil. Esta ação integrada de justiça é digna de elogios, reconhecimento e esperança. Há uma luz no final do túnel na proteção da vida das pessoas. A vida é um bem e um direito da pessoa, mas também é uma prioridade de interesse público onde a finalidade segurança pública é buscada. Quando o MP passa a representar esta pequena vida, atua na proteção da vida das pessoas, da vida em comunidade. Ao receber o amplo apoio do judiciário, renova-se a esperança protetiva das pessoas e da população na construção de uma sociedade em paz, livre, justa e solidária que tanto queremos para o nosso País.

Nenhum comentário:

Postar um comentário