quinta-feira, 23 de setembro de 2010

ATUANTE - Juíza luta por leitos a usuários de drogas

O CAMINHO ATÉ O PIRATINI. Juíza luta por leitos a usuários de drogas - RODRIGO LOPES E JEFFERSON BOTEGA, Zero Hora, 23/09/2010

Enquanto você lê este texto, 40 famílias de dependentes químicos de Camaquã aguardam decisão da Justiça para conseguir uma vaga para tratamento de um filho, irmão, pai ou mãe em um hospital de Porto Alegre. É que o município não dispõe de leitos especiais gratuitos para usuários de drogas. Desesperadas ao verem o parente muitas vezes vender eletrodomésticos de casa para comprar crack e sem dinheiro para interná-lo em clínicas particulares, as famílias buscam o que na linguagem jurídica chama-se internação compulsória. Em bom português – brigam na Justiça por um direito que a rede pública lhes nega.

– É a judicialização da saúde – diz a juíza Luciana Beledeli, da 2ª Vara Cível do município.

Há um ano na comarca de Camaquã, Luciana, 35 anos, confessa a angústia com a busca por vagas para pacientes em surto. A cada processo que ingressa no Foro, a equipe tenta por telefone encontrar um leito para o dependente em hospitais da Capital. Enquanto isso, 5,8 mil processos aguardam decisão na 2ª Vara Cível de Camaquã – 16 mil em toda a comarca.

– É um trabalho que não deveria ser do Judiciário – diz.

Médicos especializados no atendimento de viciados em drogas afirmam que o principal entrave para o tratamento dos pacientes na rede pública de saúde é a falta de leitos e a burocracia para internação, considerada indispensável no caso de usuários de crack “em crise”, quando eles perdem a consciência sobre seus atos. Como acumula a função de juíza da Infância e Juventude, Luciana recebe crianças usuárias de crack. Nos últimos anos, são comuns meninas grávidas viciadas.

– São os filhos do crack até aqui – diz a juíza, surpresa pelo fenômeno já atingir municípios de porte médio como Camaquã, com 62,7 mil habitantes.

Natural de Getúlio Vargas e formada em Direito pela Universidade de Passo Fundo, Luciana, apesar de jovem, já tem experiência no Interior: antes de Camaquã, trabalhou em Crissiumal e Constantina – onde atuava nas varas Criminal, Cível, da Infância e Eleitoral.

– No Interior, temos um contato mais próximo com as pessoas. A gente não julga apenas o papel – afirma.

Um de seus hobbies é viajar ao Exterior. Nas férias, esteve em Israel, Jordânia, Egito. Também conhece diferentes países europeus. Dos roteiros lá fora, não traz apenas ímãs de geladeira, que coleciona. Mas experiências bem sucedidas na área de políticas públicas, como a preocupação de nações desenvolvidas com o controle de natalidade:

– Isso deveria estar nas plataformas de governo dos políticos. No Brasil, a gente fala pouco em planejamento familiar. Mas não se diz que há mães que não têm condições de sustentarem a si e precisam manter cinco, seis filhos.

Luciana também acredita na necessidade de uma política de combate ao uso de drogas, com aumento de vigilância nas fronteiras:

– A gente acaba pegando apenas o pequeno traficante ou o usuário.

É por carências como essas que o tratamento de dependentes, que deveria ser assunto de especialistas em saúde, acabam na mesa de Luciana. A juíza encaminha as internações, mas sabe que, na maioria das vezes, os pacientes ficarão no máximo um mês em tratamento e voltarão para casa – e para o tráfico. Dias atrás, ela recebeu o pedido de um casal que estava internando o filho pela 12ª vez:

– O sistema de saúde não estava pronto para um boom desses. E com o crack desandou tudo.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Justamente pelo fato de que, segundo os médicos especializados, "o principal entrave para o tratamento dos pacientes na rede pública de saúde é a falta de leitos e a burocracia para internação", vejo esta ação da juíza de efeito superficial, pois o culpado pelos entraves é o Poder Executivo, no caso o Presidente da República e o Governador da Unidade Federativa, ficam impunes e continuam sem dar as condições para os hospitais e médicos atenderem a demanda. Se a ação judicial fosse mais ocntundente responsabilizando penal e cívil estes mandatários, por certo haveria leitos e postos de tratamento das dependências.

Há muito tempo as políticas anti-drogas no Brasil são focadas apenas na repressão dos grandes traficantes, sendo desprezado o tratamento dos dependentes que viram ladrões, matadores, soldados e vapozeiros do tráfico.

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