sábado, 22 de setembro de 2012

O REVISOR REVÊ SUA POSIÇÃO


22 de setembro de 2012 | 3h 07


OPINIÃO O Estado de S.Paulo

A tendência natural da imprensa é a de ressaltar como fica, a cada sessão do Supremo Tribunal Federal (STF), a situação dos réus do mensalão, com as condenações que já possam ter-se acumulado nos pareceres do relator do processo, Joaquim Barbosa, do revisor, Ricardo Lewandowski, e nas ainda poucas decisões tomadas pelo pleno da Corte. A cobertura do 26.º dia dos seus trabalhos, na quinta-feira, por exemplo, destacou que Barbosa concluiu a leitura do seu voto sobre as condutas dos incluídos no "núcleo político-publicitário", condenando por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e, eventualmente, formação de quadrilha 10 dos 11 políticos e operadores partidários acusados de terem recebido vantagem indevida do esquema de Marcos Valério, a mando do então tesoureiro petista Delúbio Soares. Apenas um ex-assessor do PL (hoje PR) saiu livre das três imputações.

O noticiário também salientou o contraste entre a severidade do relator e a propensão do revisor a matizar as suas conclusões. Examinando apenas dois réus do capítulo esgotado por Barbosa, frisaram os relatos, Lewandowski "já" absolveu um deles por inteiro, o ex-deputado federal Pedro Henry, do PP, e condenou o outro, o seu colega Pedro Correa, por corrupção passiva, mas não por lavagem de dinheiro. Os fatos foram esses mesmos. Mas, ao fixar-se predominantemente neles para atualizar o escore do mensalão e em busca de elementos adicionais que confirmariam a polaridade de enfoques entre revisor e relator, a mídia fixou as vistas nas árvores e perdeu de vista o que parecem ser novas e inesperadas movimentações do arvoredo. Essas mudanças, a se firmarem, não apenas serão decisivas para o desfecho do processo, mas poderão eliminar a diferença entre a paga de propina a parlamentar para trocar de partido e votar com o governo, capitulada no Código Penal como corrupção, e a movimentação de valores espúrios, dentro e entre as legendas, via caixa 2, que não passa de crime eleitoral.

Lewandowski, que há duas semanas votara pela absolvição do ex-presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha, por não estar convencido de que os R$ 50 mil que lhe repassara o valerioduto representavam um presente pela escolha de uma agência de Marcos Valério para cuidar da imagem da Casa - poderia ter sido dinheiro liberado pelo PT por ínvios caminhos para financiar pesquisas eleitorais nos seus redutos -, mudou da água para o vinho. Ele aceitou a "nova jurisprudência" do tribunal - instigada pela ministra Rosa Weber - de que a comprovação objetiva de que um agente público recebeu vantagens indevidas de terceiros dispensa investigar seja o motivo do recebimento, seja o destino dado aos valores recebidos. O ato em si caracteriza o crime de corrupção passiva.

A esta altura do julgamento, pode o revisor ainda abrigar as convicções íntimas que o levaram a ser leniente com João Paulo, na contramão da quase totalidade de seus pares. E pode ele, em dado momento de sua fala de anteontem, ainda ter indicado sotto voce que o dinheiro do mensalão fazia parte de acordos de "financiamento de campanha" - a tese do caixa 2 alegada pelo PT para minimizar o escândalo. Mas o essencial - o grande fato novo do julgamento - é ter ele admitido que se curvou ao entendimento dominante na Corte. A ponto de dizer, pouco depois, em entrevista, que a razão de ser do mensalão - compra de apoio parlamentar para o governo Lula, ou acertos financeiros com aliados presentes e futuros para quitar dívidas de campanhas e engordar os cofres para as disputas seguintes - tornara-se irrelevante. "Não há necessidade de entrar nesse tipo de elucubração", encerrou o assunto.

Daí se pode prever que Lewandowski só absolverá réus de corrupção passiva se entender que as acusações contra eles foram ineptas, como no caso de Pedro Henry. Com a mesma ressalva, terá de condenar os hierarcas do PT pelas operações de corrupção ativa executadas por Valério em parceria com a sua gente na banca mineira. Contra o tesoureiro Delúbio Soares, há provas e confissões. Contra o presidente José Genoino, assinaturas indeléveis em contratos de fancaria. Contra José Dirceu, o "domínio do fato" - o poder de mandar fazer.

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